E eis que, depois de uma significativa revisão do Código dos Contratos Públicos e da aprovação de um regime especial muito relevante em matéria de contratação pública (ambas operadas através da Lei n.º 30/2021, de 21 de Maio), o presente ano de 2021 não termina sem antes nos deixar uma última novidade legislativa interessante.

Assim, foi hoje publicada no Diário da República a Lei de Bases do Clima (aprovada pela Lei n.º 98/2021, de 31 de Dezembro).

Passarei ao lado de alguns aspectos gerais mais “duvidosos”, embora, numa análise rápida, valha a pena assinalar dois: (i) o reconhecimento, por via legal, de uma “situação de emergência climática” (artigo 2.º/1) – com o pormenor delicioso de, no artigo 2.º/2, o legislador esclarecer que não estamos perante uma declaração de verdadeiro estado de emergência ao abrigo do artigo 19.º da Constituição (como se este pudesse ser declarado por lei da Assembleia da República e vigorar pelo período indeterminado de vigência dessa lei…), embora pretenda aditar um novo fundamento ao elenco constitucional de motivos que permitem a declaração desse estado de emergência –;  e (ii) a atribuição, a todos, de um “direito ao equilíbrio climático” (artigo 5.º/1).

Cingindo-me ao que particularmente interessa aos leitores deste blog, chamo apenas a atenção para os seguintes pontos de relevância desta Lei de Bases do Clima em matéria de contratação pública:

– O dever de as Administrações central, regional e local de, preferencialmente, financiar projectos, contratar serviços ou concessionar serviços públicos, de forma exclusiva ou parcial, que cumpram os princípios da taxonomia sobre atividades ambientalmente sustentáveis da União Europeia (artigo 36.º/4);

– A obrigação de entidades e os serviços da Administração Pública contribuírem activamente para a consecução dos objectivos desta lei, designadamente adoptando práticas e comportamentos com reflexo na sua organização e funcionamento, incluindo no âmbito da contratação pública, tendentes à descarbonização da sua actividade (artigo 37.º/1);

– A obrigação de a aquisição de bens e a contratação de serviços obedecerem a critérios de sustentabilidade, tendo em conta o respetivo impacto na economia local e promovendo o recurso a materiais disponíveis localmente, sem prejuízo da igualdade de acesso dos operadores económicos aos procedimentos de contratação (artigo 37.º/4). Mais um interessante (e problemático?) afloramento das “preferências locais” que já foram criticadas na última revisão do Código, efectuada através da acima citada Lei n.º 30/2021…

– A obrigação de, no prazo de um ano, o Governo apresentar na Assembleia da República um relatório em que identifique os diplomas em potencial divergência com as metas e instrumentos climáticos da presente lei, devendo, para o efeito, ser analisados, entre outros diplomas, o Código dos Contratos Públicos [artigo 75.º, alínea c)].

Nesta linha, para os interessados em contratação pública, o ano de 2021 teve novidades até ao fim: aguardemos o que 2022 nos trará, (também) nesse âmbito.

Este blog deseja a todos os leitores um Excelente Ano Novo!