O artigo 6.º do CCP promovia uma restrição à aplicação da parte II do Código, não apenas para a celebração de contratos entre entidades adjudicantes do n.º 1 do artigo 2.º (n.º 1), mas também para a celebração de contratos pelas entidades adjudicantes do n.º 2 do artigo 2.º (e pelo Banco de Portugal) independentemente da natureza da outra (futura) parte (n.º 2).
Em concreto, o n.º 1 do artigo 6.º determinava que os contratos a celebrar entre as entidades adjudicantes do n.º 1 do artigo 2.º apenas estavam sujeitos à parte II do Código caso o seu objeto incluísse prestações típicas dos contratos de empreitadas ou concessão de obras públicas, concessão ou aquisição de serviços e locação ou aquisição de bens móveis. O n.º 2 do artigo 6.º estabelecia a mesma estatuição para as adjudicações promovidas pelas (não “entre”) entidades adjudicantes do n.º 2 do artigo 2.º (organismos de direito público) e pelo Banco Portugal.
Com a revisão de 2017, a restrição do n.º 2 do artigo 6.º passou a constar do n.º 8 do artigo 5.º, mas semelhante decisão legislativa não foi tomada quanto ao n.º 1 do artigo 6.º, que foi, de facto, revogado (no entanto, é possível que a minha “busca” por disposição igual ou de objeto semelhante não tenha sido suficientemente atenta; se for o caso, há que ignorar as linhas que se seguem).

Encontramos motivos para elogiar esta opção.

Desde logo, comparando o n.º 1 do artigo 6.º com o n.º 2 do artigo 16.º, relativo à identificação das prestações que se consideram submetidas à concorrência de mercado, concluía-se que a menor rigidez promovida pelo primeiro resumia-se, em grande medida, à não aplicação do regime pré-contratual do Código aos contratos de sociedade celebrados entre entidades adjudicantes. Sendo que, nos termos da alínea d) do n.º 4 artigo 5.º, já se determinava a não aplicação da parte II aos «contratos de sociedade cujo capital se destine a ser exclusivamente detido por entidades adjudicantes referidas no n.º 1 do artigo 2.º». A relevância do n.º 1 do artigo 6.º era, de facto, diminuta.
Por outro lado, o n.º 1 do artigo 6.º levantava um problema interpretativo sobre aplicação do n.º 1 do artigo 5.º a contratos entre entidades adjudicantes do n.º 1 do artigo 2.º que envolvessem as prestações típicas elencadas no primeiro [o mesmo problema levantou-se quanto à interpretação conjugada do n.º 1 do artigo 5.º e do n.º 2 do artigo 16.º: a favor da aplicação do n.º 1 do artigo 5.º aos contratos subsumíveis ao n.º 2 do artigo 16.º juntaram-se, por exemplo, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA (Concursos…pp. 145 e 146), bem como MIGUEL RAIMUNDO (O objeto sujeito à concorrência…in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda… pp. 676 a 695); em sentido contrário, JOÃO AMARAL E ALMEIDA e PEDRO FERNÁNDEZ SÁNCHEZ, A inexistência de concorrência…in Temas de Contratação Pública, pp. 219 a 235)]. Havia ainda quem contestasse, em parte, a sua pertinência, por na prática não se conhecer entidade pública subsumível ao elenco do n.º 1 do artigo 2.º que disponha de alvará de empreiteiro para que pudesse executar uma obra ao abrigo de um contrato de empreitada ou concessão de obra pública que envolvesse a sua execução.

Em suma, parece-nos positiva a revogação do n.º 1 do artigo 6.º do CCP, sendo que identificamos duas consequências imediatas da sua eliminação:

i. Ficam, em abstrato, sujeitos à parte II do CCP os contratos de sociedade a celebrar entre entidades adjudicantes do n.º 1 do artigo 2.º caso o capital não se destine a ser exclusivamente detido por essas entidades;

ii. Reforça a relevância aplicativa do n.º 1 do artigo 5.º (bem como do artigo 5.º-A), para que as entidades adjudicantes possam justificar a celebração interadministrativa de outro tipo de contratos em desconsideração das regras pré-contratuais do Código (anteriormente, dispondo do n.º 1 do artigo 6.º, bastava a sua invocação para afastar a aplicação da parte II a outro tipo de contratos que não os aí elencados).