Na versão em discussão do ante-projecto do Código dos Contratos Públicos o antigo ajuste directo e agora divido em ajuste directo strictu sensu e em procedimento de consulta previa. Por si mesma, esta alteração de nomenclatura faz sentido e nada ha a apontar quanto a ela.

O mesmo não se poderá dizer quanto a substancia da alteração em causa. Sendo certo que os limites do ajuste directo (strictu sensu) são hoje bem mais baixos do que no passado o procedimento de consulta previa agora oferecido não resolve o que a meu ver e o maior problema do regime de contratação publica em Portugal: a falta de transparência e publicidade da maioria dos contratos públicos do pais. De acordo com os dados disponibilizados no Relatório Contratação Publica 2013, e possível verificar que 50.1% do valor gasto em contratos públicos em Portugal e feito de uma forma não transparente via ajustes directos (no seu conceito antigo). Não falo sequer na percentagem de procedimentos a qual e também muito significativa – 83.5% são ajustes directos.

Estes números são impressionantes e e pena que o Governo não os tenha considerado aquando da reformulação do ajuste directo. Ainda ha tempo para corrigir o erro, talvez re-considerando a consulta previa como um procedimento de publicidade obrigatória e em que fosse garantido o principio da igualdade a todos os concorrentes.

E apresentada amiúde como desculpa contra a verdadeira abertura a concorrência de contratos de baixo valor o risco de que haverá demasiadas propostas para analisar. Como acima disse, cada proposta que um concorrente apresente acarreta custos de transacção e de oportunidade que não são de menosprezar. Não seria de espantar um incremento de propostas em alguns sectores a qual pode ser minimizada com cuidado e clareza na forma como são desenhadas as pecas concursais. E que num mercado com muitas oportunidades, não da mesmo para ir a todas. Gostaria de sugerir o trabalho que fiz com entidades contratantes em Gales onde foi possível abrir a concorrência em contratos de baixo valor sem que tivesse havido qualquer problema de excessiva concorrência ou desaparecimento de PMEs do mercado, muito pelo contrario. Os casos de estudo estão disponíveis aqui.

Se o meu trabalho de campo foi realizado com pequenas instituições e com um escopo limitado, o mesmo não se poderá dizer da mudança de paradigma operada no Governo do Reino Unido que desde 2014 exige a todas as entidades contratantes que de si dependem (essencialmente ministérios) a obrigação de publicitar todos os contratos com um valor superior a £10,000 (€11.000). Ate agora não ocorreu qualquer problema de maior nem parece haver vontade política do novo Governo para reverter ao paradigma anterior. Mais, O Governo do Reino Unido tem investido tempo (e dinheiro) para melhorar a experiência dos operadores económicos com procedimentos e e de destacar o trabalho feito pela equipa do Digital Marketplace nesse sentido. Caso seja de interesse, aqui esta uma entrevista que realizei com Warren Smith, Director do Digital Marketplace.

 

Posto isto, seria um excelente desenvolvimento para a contratação publica em Portugal caso o Governo seguisse o exemplo do Reino Unido e mudasse o paradigma no que toca a maioria dos contratos que hoje se realizam no pais, submetendo-os de uma forma transparente e completa a concorrência.